Professor de geometria. Competente e ambicioso. Não aquela ambição que motiva e impulsiona à riqueza, mas a que lhe desse melhor qualidade de vida, talvez até casar e constituir família. Ambição natural e saudável.
Nesse sentido, tinha duas matrículas: uma na rede pública estadual, outra em rede particular. Nesta última progrediu rápido até chegar a supervisor de ensino. Agora está bom, pensava. Podia casar, alegrava-se.
Em tratativas pertinentes ao cargo, precisou deslocar-se à sucursal de Belo Horizonte, cidade que não conhecia. Após desincumbir-se da missão que o levara, ao cair da tarde, passeou pelo entorno do hotel em que se hospedara.
Corria um vento persistente e brincalhão, a mexer-lhe os cabelos, levemente frio. Pensou em sentar-se a um bar e beber algo quente. O bar estava lotado, pediu licença a um senhor solitário em mesa na calçada e iniciou conversa:
— Sou do Rio de Janeiro, vim a trabalho. O senhor é ...
— Mineiro. O povo de Minas gosta muito do Rio. Quando eu era moço ia muito na praia de Cabo Frio. Conheço também Copacabana.
— E o que me diz de B H, o que tem de bom por aqui?
— Aqui tem muito trem bom, uai!
— Por exemplo?
— Mulher bonita, bebida boa...
— O que está bebendo?
— Batida de coco com leite Moça.
— Leite condensado?
— Só um tiquinho, pra melhorar o sabor.
O carioca chamou o garçom e pediu a batida de coco com leite condensado. Bebeu-a quase de um gole só, tão gostosa que era.
— Deliciosa!
— É...
— Garçom, mais uma. E pelo mesmo caminho foi a segunda batida.
— Magnífica!
— É...
E já na terceira dose:.
— Divina! Desce redondo, redondinho.
E o mineiro, olhando com algum espanto o carioca, mas com ligeiro sorriso no canto da boca:
— É. Mas costuma subir quadrado, quadradinho.
Então o professor começou a sentir zonza a cabeça e um suor frio a escorrer- lhe das frontes. Tentou levantar- se , as pernas tremeram. E quando conseguiu ficar de pé, cambaleou, endireitou-se e seguiu, aos trancos e barrancos, rumo ao hotel. Entrou no quarto e desabou na cama.
Nessa noite não sonhou com belas mulheres e prazeres tais e quais. Nessa noite sonhou com a quadratura do círculo.*
* PS: problema geométrico proposto pelos antigos gregos e que consiste em construir um quadrado de área igual à de um círculo dado, usando apenas compasso e régua não graduada, recursos que os gregos possuíam, permanecendo insolúvel durante cerca de 25 séculos. Atualmente é resolvido por meio de cálculos algébricos.
0 comentários:
Postar um comentário