Quinta-feira li uma crônica de um escritor gaúcho que admiro muito, onde ele dizia não entender o cálculo das perdas dos estados produtores no caso do pré-sal. Dizia haver uma sutil diferença entre perder e deixar de ganhar. Os recursos do pré-sal ainda estão lá no fundo, pertencem ao futuro. Portanto, seja lá como for a partilha desses recursos, os produtores não perdem, apenas deixam de ganhar.
Desculpe-me caríssimo cronista, sou seu fã incondicional, mas creio que está mal informado. A atual polêmica em torno da Emenda Ibsen decorre, não dos royalties do pré-sal, que podem sim ser repartidos pelos demais entes federados, mas da inclusão na mesma emenda dos campos em produção, já licitados e contratados e cujos recursos já fazem parte dos orçamentos de estados e municípios produtores. A Emenda Ibsen estanca de imediato esses recursos, para serem distribuídos entre todos. Os produtores perdem sim, caríssimo cronista, não apenas deixam de ganhar.
A propósito, o Estado do Rio, para atender a exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal, renegociou sua dívida com a União em 99 dando como garantia de pagamento parte da renda dos royalties da produção futura de petróleo até 2019. Uma grande parte dos recursos recebidos pelo Rio retorna à União e se cessarem só resta o calote. Nesse caso a União pode e deve confiscar receitas de ICMS do estado. Olhem só a encrenca que o Senhor Ibsen e senhores deputados armaram. Agora acenam com outra emenda, atribuindo à União o ressarcimento das perdas dos produtores. Temos então que, se as duas emendas forem aprovadas, o Rio perde recursos, dá calote na União e esta manda recursos para o caloteiro pagar sua dívida. Seria cômico, se não fosse trágico!
Leio também que o governo federal está preocupado com o novo marco regulatório da mineração, a ser apresentado brevemente ao Congresso. Vá que resolvam fazer o mesmo que estão fazendo com o petróleo! Parlamentares do Rio, do Espírito Santo e de São Paulo já se preparam para apresentar emenda semelhante, em retaliação, caso a emenda do Ibsen não seja derrubada no Senado. O líder do governo na Câmara dos Deputados diz que a base aliada não pretende, com os minérios, repetir o mesmo erro cometido no pré-sal. O que aparecer será vetado, diz.
Então havia algo que se podia fazer para evitar a insanidade da emenda Ibsen? Por que não se fez? Faltou liderança, dizem alguns. Eu digo que sobrou irresponsabilidade e ganância por dividendos eleitorais! A começar pelo regime de urgência requerido ao Congresso pelo companheiro-presidente e sua candidata.
E o companheiro-governador, ein? Fez tudo bonitinho na passeata, até evitou constrangimentos ao companheiro-mor e agora ele declara que o problema é do Congresso. Logo com você, que inaugurou hospital construído inteiramente com recursos do estado – nada a ver com o PAC – e convidou o companheiro-presidente e sua candidata para a festa eleitoreira! Chupa essa, governador, mas não se preocupe, o companheiro-presidente não podia mesmo prometer em público, para milhões de eleitores Brasil afora, o que lhe prometeu a quatro paredes. Não seria ético com o Congresso. Nem seria eleitoreiro. O homem não é bobo!
Mas cuidado, companheiro-presidente; isso que Vossa Excelência fez tem outro nome na cabeça do autor daquelas duas frases censuradas na Candelária: o companheiro amarelou!
Domingo, 21 de março de 2010
P. S.: Contra as minhas expectativas, nesta madrugada do dia 10 de junho de 2010, o Senado acabou de perpetrar a covardia iniciada na Câmara contra o Rio de Janeiro e Espírito Santo e seus municípios produtores, aprovando a Emenda Ibsen com modificações.
E agora, companheiro-presidente? Deixaram Vossa Excelência numa sinuca-de-bico, mas não foi a oposição e sim a sua própria base parlamentar! E agora, repito, vai vetar ou amarelar? - não esqueça aquelas duas frases que eu li na Candelária e foram censuradas pelo nosso companheiro-governador! (vejam a crônica "Da Candelária à Cinelândia").
Sei que não é assim, porém; o projeto sofreu modificações, voltará à Câmara para aprovação final, enquanto isso ganha-se tempo e depois Vossa Excelência enrolará mais um pouco - até o fim das eleições - e então vetará ou não - dependendo talvez dos humores da hora ou da performance eleitoral de sua candidata no Rio de Janeiro. Para tal não lhe faltará esperteza e tino político, mas espero que prevaleça em Vossa Excelência o estadista.
Um último comentário se faz necessário: a modificação ou "aperfeiçoamento", como diz o senador Simon, implica que a União ressarcirá os prejuízos causados aos produtores. Assim ficam o Rio e os demais sujeitados econômica e politicamente ao governo federal (seja ele qual for) - já que a emenda não prevê a origem dos recursos para esse ressarcimento - e dependentes de seus humores e boa vontade, de pires na mão, esmolando o que tinham por direito constitucional. Assim é fácil fazer "aperfeiçoamentos", Sr. Simon!
E tem ainda o caso do ICMS sobre petróleo e derivados e energia elétrica, acordado na Constituição de 88 - a Redentora do Sr. Ulisses Guimarães! (vejam a crônica "Chupa essa manga , candidato").
Como veem, pela segunda vez o Rio está sendo...; mas eu não vou relaxar nem revirar os olhinhos... E mais não digo para não faltar com o respeito aos meus eleitores.
O Rio não pode se conformar com tamanha vilania! Convoque outra passeata, governador, depois da copa e bem no início da campanha eleitoral (se for capaz). Desta vez levarei os meus filhos.
Manhã do dia 10 se junho de 2010
P. S. 2: O Sr. Ibsen Pinheiro continua repetindo o mesmo argumento esfarrapado de que os produtores só teriam direito aos royalties se o petróleo fosse extraído em seus próprios territórios; a plataforma continental pertence à União, portanto de todos. Assim é, mas não quanto aos royalties, pois não é o que diz a Constituição.
O ilustre parlamentar e tantos outros do mesmo pensamento parecem ignorar o que ocorre no Golfo do México: desastre ecológico sem precedentes nas praias e costas americanas, provocado por vazamento ocorrido em alto mar, a quilômetros e quilômetros de distância!
Tarde do dia 10 de junho de 2010
P.S. 3: Palhaçada!
O deputado estadual Jorge Picciani, representando o Rio de Janeiro na Convenção Nacional do PMDB, juntamente com o prefeito Eduardo Paes e o vice-governador - já que o próprio não compareceu - proferiu veemente discurso contra a emenda aprovada no Senado, dizendo:
- Não aceitaremos de forma alguma esse crime. Iremos às ruas, à luta, à morte.
Que belo discurso, deputado! Mas carece isso tudo não; bastava que todo parlamentar, todo dirigente deste país tivesse vergonha na cara! Mas pensando bem, talvez seja mais fácil a guerra que Vossa Excelência propõe!
Domingo, 13 de junho de 2010