21 de abr. de 2014

Um editor atrapalhado


Uma das ilustrações de
"Galo, galinha e pinto e outras histórias"
Escrevo estas poucas linhas, se não são poucas foi a maneira de iniciar o texto dando notícias do meu “Galo, galinha e pinto e outras histórias”, há tempos prometido e ainda não cumprido.
Já disse que ando com veleidades de escritor neófito; pois agora meti-me também a editor. Imaginem!
Para tal era preciso que me cadastrasse na Agência Brasileira do ISBN para obter o meu prefixo editorial e o ISBN (International Standard Book Number) e código de barras para o livro a ser editado. Isto eu queria, para que o meu livrinho tivesse todas as formalidades dos outros livros. As editoras de demanda fazem o procedimento, mas cobram, é claro, e a menos que eu tivesse uma editora que me bancasse, era preciso diminuir custos. E é “facinho”, é on line, me disse a simpática atendente da gráfica onde fiz o orçamento para uma tiragem de 500 exemplares.
Pois bem, meus amigos, não era tão facinho assim.
Pra começar, o site da agência é novo, e como toda coisa nova, ainda não testada pelo uso, apresentava algumas deficiências de informação e comunicação, que eu só pude superar com inúmeros telefonemas para a agência, ao longo das quatro tentativas que fiz.
Na primeira tentativa logo desisti. E optei por ir pessoalmente na agência entregar os documentos e comprovante de pagamento dos serviços. Não pode, o senhor começou on line tem que terminar on line. Mas não tem problema, nós lhe devolvemos a tarifa na sua conta corrente. Não tem problema! óh, céus!
Segunda tentativa on line: cancelada sem eu saber o porquê.
Quando voltei de minhas férias das férias nos sertões do Pará, dei um tempo, escrevi várias crônicas, dei mais um tempo e voltei à carga: terceira tentativa. Desta vez notei várias informações que não existiam antes no site. Uma delas: os tipos de arquivos que o sistema admitia para anexar CPF e folha de rosto. E agora ficava sabendo por que nada dera certo antes: um dos meus arquivos a anexar estava em jpg e o outro em doc – um dos padrões não aceitos pelo sistema. Chamei o meu Rafael, que rapidamente transformou, não sei por que passes mágicos, doc em pdf, e assim foram anexados.
Desta vez vai! Ah! se não!
Não foi. Recebi e-mail: não foi possível atender o seu pedido; diagnóstico do analista – anexar CPF e folha de rosto.
Putz!
Passaram-se alguns dias em que  fiquei ruminando o acontecido e fui para a quarta tentativa, e esta seria a derradeira, eu já estava a ponto de mandar tudo para os quintos dos infernos (menos o meu livrinho, é claro!). Por precaução eu mesmo preparei os dois arquivos em jpg, vá lá saber se deram errado as mágicas do meu filho Rafael. E chamei o meu Daniel para ficar ao meu lado fiscalizando, no pressuposto de eu estar errando algum procedimento.
E clic daqui e clic dali, o CPF já está anexado, agora vamos para a folha de rosto…Não, pai, não! Espera um pouco, deixa completar a transferência do arquivo…
Putz! Mil vezes putz!
Até aqui eu fechava o pedido de ISBN antes que se completasse a transferência dos arquivos (quando pára de rodar aquele circulozinho, lá em cima, e que eu nem via). Por isso os arquivos não iam, não chegavam na agência. Ai, meu pai! Tu te enchias de suor e fuligem na carvoaria, mas não tinhas que passar por isto!
Bem, amigos, desta vez deu certo, já estou com o prefixo editorial e o ISBN para Galo, galinha e pinto, mas tem um outro porém: gastei o dinheiro que reservara para a impressão. Nada que não se resolva, mais um pouco de paciência, em julho mando para a chocadeira (ou será prelo?).
Empanturrem-se de futebol e aguardem.

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3 de abr. de 2014

O misterioso entregador de revistas


Pensava que tinha lido Vidas secas, de Graciliano Ramos; engano da minha memória; o que eu li, na minha juventude, foi Seara vermelha, de Jorge Amado, sobre o mesmo tema da seca nordestina. E vi, na mesma época, o filme de Nelson Pereira dos Santos sobre a obra do Graciliano. Mas do enredo e dos personagens pouco lembrava, só não esqueci da cachorrinha Baleia.
Estava pois a ler Vidas secas na manhã do último domingo, sentado no sofá da varanda, quando Rita, – que saía para a missa – , voltou e entregou-me a revista: “Olha aqui, entregaram hoje”. Concentradíssimo como estava na leitura, peguei a revista e olhei a capa: nenhuma imagem ou forma bem definida ou impactante; apenas tons de azul, esmaecidos e imprecisos, puxados ao branco, nada que me chamasse a atenção de imediato. O melhor é que eu não precisaria telefonar para a editora reclamando dos desacertos do entregador nas últimas semanas. Agora me entregava a revista adiantado, pois que geralmente é entregue às segundas ou terças. Pousei a revista no sofá e retomei a leitura do  Graciliano, que só terminei por volta do meio-dia.



Esclarecendo o leitor: já notara a falta da revista durante as semanas anteriores, até que uma vizinha entregou-nos dois exemplares, dizendo que um terceiro se estragara com a chuva, e que o entregador as entregara por engano em sua casa. Verifiquei a etiqueta de endereçamento; o meu endereço estava correto, o entregador é que era um trapalhão (ou míope).
Depois do almoço fui tirar a sesta. Quando acordei, lembrei-me da revista e decidi terminar o dia lendo-a. Fui buscá-la ao sofá. Não a encontrei. Rodei a casa, nada. Fui ao quarto e perguntei à Rita ainda sonolenta: nada sabia da revista. Voltei ao sofá, já intrigado, procurei atrás, dos lados, embaixo. Nada! Esperei meus filhos descerem e perguntei-lhes; não pegaram a revista! Desisti de procurar a maldita revista.
Segunda-feira falei novamente a Rita sobre o caso; ela jamais me estregara revista alguma. Então eu sonhara, só pode! Mas em nenhum momento percebi ter sonhado, como é comum quando acordamos após um sonho. A impressão foi tão nitidamente real que sequer desconfiei da possibilidade de um sonho. Aquela revista, aquela capa de tons azuis esmaecidos, puxados ao branco…




Terça-feira entregaram-me a revista: estava na caixa de correio. Não a recebi de Rita, mas de Daniel, meu filho. E eu não estava no sofá lendo Vidas secas, mas na cozinha lavando a louça. E aquela revista agora em minhas mãos eu já conhecia, aquela capa em tons de azul esmaecido, puxados ao branco… Era uma reportagem sobre a escassez de água em São Paulo e outros lugares.
E agora o que me dizem, caríssimos, desse entregador de revistas? Não o de terça-feira, mas o de domingo?

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16 de mar. de 2014

Book Crossing Blogueiro


A partir do Luz de Luma, o blog da minha amiga virtual Luma Rosa, desço da estante o primeiro livro para fazê-lo viajar pelos caminhos do bookcrossing blogueiro. O meu primeiro viajante é o Dom Casmurro, de Machado de Assis, obra que gosto demais. Mas não ficarei órfão de Dom Casmurro: tenho outro exemplar. Para quem não conhece, o procedimento é muito simples: fazer o livro chegar a outros leitores, “esquecendo-o” em lugar público e de fácil acesso (ônibus, trem, por exemplo), com o aviso de que o livro não foi esquecido ou abandonado, mas que se destina à leitura de outras pessoas – que devem, por sua vez, “esquecê-lo” também nas mesmas condições, para mais leitores usufruírem dele. Mais esclarecimentos e informações sobre o Bookcrossing Blogueiro veja no Luz de Luma. Ela vai adorar sua visita.




Não fiz uma resenha do Dom Casmurro por ser a obra demasiado conhecida e também, confesso, por não ser fácil resenhar. Mas escrevi uma história de carnaval que envolve o livro de Machado com as folias momescas. Se me dão a honra, confiram.


1 - Viajante: Dom Casmurro, de Machado de Assis
         Início da viagem: 17/03/2014

2 - Viajante: O Melhor do Conto Brasileiro 1 de Aníbal Machado/Josué Montello/
                                                                          Rachel de Queiroz/Orígenes Lessa
         Início da viagem: 24/03/2014

3 - Viajante: Morte na Mesopotâmia, de Agatha Christie
        Início da viagem: 26/03/2014

4 - Viajante: Cacos da memória, de João Antonio Ventura
        Início da viagem: 03/04/2014

5 - Viajante: Movimentos culturais da juventude, de Antonio Carlos Brandão e
                                                                               Milton Fernandes Duarte
         Início da viagem: 12/04/2014

6 - Viajante: Dom Severo em 4 tempos, de Severino Honorato
        Início da viagem: 12/05/2014


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7 de mar. de 2014

Uma história de carnaval


Este ano não fui para Maricá, como de hábito, e resolvi reler um livro que gosto muito: Dom Casmurro, de Machado de Assis. Desde a juventude, é a terceira ou quarta vez que o leio. Desta feita, por andar com veleidades de escritor neófito, li-o com atenção redobrada, cuidando das palavras desconhecidas ou pouco íntimas, dicionário ao lado; e do estilo do autor, de sua técnica narrativa, de como vai construindo a trama, à maneira de um delicado mosaico, peça a peça, sutileza a sutileza, deixando pistas aqui e ali, um argumento acolá, novos indícios e dúvidas mais além.
Trata-se do clássico e sempre recorrente triângulo amoroso: neste caso Bentinho, Capitu e Escobar. Mas é, antes de tudo, o romance da dúvida. Dúvida para o leitor, que ao fim não tem convicção formada: Capitu traiu ou não traiu? Depende do leitor; em verdade ninguém sabe, ninguém viu.
E que mulher, a Capitu! Ah! Bentinho, por que tinhas de ser tão casmurro? Tão melhor seria que fosses mais generoso e menos ciumento, e assim viverias o resto dos teus dias navegando num mar de delícias com a tua Capitu… Mas neste caso também não teríamos esta obra prima do bruxo do Cosme Velho…
…Perdão, leitores. Perdoem o meu envolvimento. Eu pretendia contar uma história de carnaval, se é que não me enganei no título. Pois vamos a ela, sem mais delongas.


Li pra mais da metade do livro na segunda-feira de carnaval. À noite recebi uma ligação da mãe de Yasmin, que voltou a morar com a pequena na vila militar do Galeão, convidando para um churrasco em sua casa, na terça. Fui. Numa sacola levei 1Kg de contra-filé e uma sobremesa preparada por Rita, que não quis ir. Para ler no ônibus, levei o Dom Casmurro. Antes não levasse…
Depois do churrasco que, para desgosto do meu estômago foi servido lá pelas tantas da tarde, fomos todos espairecer no Complexo Recreativo, onde nesses dias sempre rola alguma coisa. As mesas da varanda quase lotadas, crianças fantasiadas dentro do salão, brincando com serpentinas e confetes. Deliciosas marchinhas carnavalescas – dos carnavais antigos – é o que havia de festa momesca. Não que a família militar não seja animada  – já fui a grandes bailes de carnaval em clubes militares – mas há que ter quem os organize e o Complexo serve mais para comemoração de aniversários, batizados, natal e outras datas do tipo, em suma, para a distração, o divertimento e a prática de esportes no dia-a-dia dos moradores da vila.
Sem ânimo momesco nas veias - lembrem-se que estava lendo um livro -, dei uma espiada no salão e dirigi-me discretamente para a varanda dos fundos, onde também há um barzinho, no pressuposto que meus acompanhantes preferissem ficar na frente. Sentei-me e ataquei de Dom Casmurro.
Dentro em pouco estava rodeado por meus convivas e mais além três mesas se juntavam para acomodar uma família, esta sim, com espírito carnavalesco: os dois homens, um mais ou menos da minha idade e de cabelos brancos e o outro mais jovem, que mais tarde vim a saber tratar-se de seu genro, ambos fantasiados de mulher. O senhor de cabelos brancos eu já conhecia desde a matinê de domingo, quando estive no local acompanhado por Rita, Yasmin e seus familiares. Na ocasião, este senhor, enfiado no mesmo vestido e a cara borrada de maquiagem, sapecara-me um beijo no rosto com as graças típicas e caricatas da fantasia. Tudo se deu entre risos e galhofas.


Como os do meu grupo aparentemente não se incomodavam que estivesse lendo, continuei lendo. A certa altura o senhor/senhora de cabelos brancos, dirigindo-se ao banheiro masculino, parou ao meu lado e, com trejeitos afetados e voz de falsete feminil, convidava-me ao banheiro para ajudá-lo num “serviço”. Já meio sem jeito, mas ainda com ferpley, disse-lhe que não fazia serviços desse tipo; rimos e apertamo-nos as mãos. E foi risota geral.
Agora a trama estava chegando ao clímax, atenção redobrada na leitura, foco total na desventura dos dois amantes; eu não estava ali com os meus, estava com Bentinho e Capitu… Então veio o susto e a minha reação automática e incontrolável, como no estouro inesperado de um rojão: levantei-me quase de um pulo, abrindo  os braços e afastando com energia as duas “senhoras” importunas que tentavam beijar-me o rosto, uma de cada lado.
- Não! Não! Brincadeira tem limite, pô!
Não, creio que não disse palavrão, mas não estranharia se tivesse dito. Assustei-me com a surpresa do ataque das “senhoras” num momento de extremo envolvimento literário. Quase fervi de irritação por me terem tirado do enleio em que me achava. Desta vez não houve risos, mas caras espantadas.
Escusado dizer que dali em diante não havia clima para continuar lendo; terminei o livro na quarta–feira de cinzas.
Já calmo, passei na mesa das “senhoras”, expliquei-lhes a minha reação e pedi desculpas; também as recebi, efusivamente, com apertos de mãos e tapinhas nos ombros.
E o riso voltou. Era carnaval. Evoé, Baco!

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