10 de jun. de 2015

Parem o bonde que eu quero descer! (mas não há bonde)

No último fim de semana fui a São Gonçalo visitar a minha irmã Rosa. Fui pelos modais de costume: trem, ônibus, barca, ônibus. Gosto de passar na praça XV, pelos ecos do passado barroco ali presentes, e mais recentemente para “fiscalizar” as obras em andamento naquela região, que prometem revitalizar lindamente toda a orla, do Largo da Misericórdia até o cais do porto. Tenho outra motivação antiga: cruzar a Baía de Guanabara, por cujas águas naveguei, entrando nesta cidade, há mais de 58 anos. É um regalo aos olhos e um resvalar em nostalgias que me serenam a alma, longe das aflições de agora.
Pois bem. Em Niterói fiz um lanche e dirigi-me ao terminal rodoviário para a última etapa da viagem. Antes deparei-me com um grupo de teatro de rua, se assim posso dizer; um ator e uma atriz (jovens) representavam no chão, sem que eu pudesse atinar do que se tratava; várias mulheres à volta ostentando cartazes, em silêncio. Pus-me a ler os cartazes: todas elas eram vítimas de abuso sexual na infância ou adolescência. Os atores representavam um roteiro de pedofilia doméstica (pai e filha), possivelmente óbvio, mas convincente e angustiante para mim, que o assistia. Retirei-me. A serenidade interior esvaíra-se.
Não que no meu tempo não houvesse pedofilia. Nem tenho reparos a fazer ao grupo que se manifestava em repúdio a esse abominável crime contra a infância. É preciso mesmo divulgar e conscientizar as pessoas sobre esses fatos, infelizmente, ainda corriqueiros. Retirei-me porque estou saturado desses horrores: crianças maltratadas, abusadas; crianças morrendo de fome e doenças; outras fugitivas da guerra, com suas famílias, embarcadas como escória em frágeis embarcações, na esperança de uma vida melhor, e muitas delas finalmente sepultadas no fundo do Mediterrâneo.
Retirei-me porque estou cansado de tanta informação ruim. Se fico em casa a televisão me bombardeia, se saio... O mundo está virando um circo dos horrores (ou já era e não sabíamos).
E ver aquela menina com os olhinhos fixos na teleobjetiva, em meio à grande tragédia, e ainda assim, com tanta inocência, esboçar um leve sorriso… dói... 

4 comentários:

Marly disse...

Olá, João,

Eu também tenho sentido esta mesma estupefação, frente a muitos acontecimentos do nosso tempo, sei lá, parece que a vida radicalizou, rsrs. Acho, inclusive danoso, o modo como muita gente expressa rejeição a um acontecimento ou idéia, atualmente. Mas acredito que as coisas voltarão ao equilíbrio, pois os comportamentos são cíclicos. Ah, só cheguei aqui porque há uns três dias começaram a aparecer o feed de alguns blogs (o seu, entre eles), cuja atualização nunca me era apresentada no blogger.

Um abraço

Luma Rosa disse...

Oi, João!
Atualmente para chamar atenção, tem que chocar! Pois a banalização está presente no comportamento como se as pessoas vivessem anestesiadas. Essa angustia que sentiu e o desarranjo interior, só provam que o grupo teatral conseguiu o seu intento e o fez pensar sobre o assunto que é revoltante.
No passado do "Luz" organizei uma blogagem coletiva "Contra a pedofilia, em defesa da infância", na qual encaminhei para o senado uma carta com os links dos participantes como se fosse um abaixo assinado, pedindo a abertura de uma CPI. O único que se prestou a ajudar foi o senador Magno Malta que vestiu a camisa, abriu a CPI e até hoje luta para que seja aprovada prisão perpétua para pedófilos. Para mim, bastava que fossem castrados... rs.
Beijus,

Anônimo disse...

Vô tonico, tenho a mesma opinião da Luma. Às vezes é necessário um choque de realidade para que as pessoas parem , pensem e ajam face a tanta injustiça.
abraço, garoto

Catarina H. disse...

Percebo bem o que diz. Já ando mais que farta, saturada de tanta violência, coisas más e horrores com que somos bombardeados no dia a dia. A vida sempre foi difícil e complicada, com guerras, fome, doenças. Mas o que eu acho que mudou foi a exploração das situações, da dor dos outros. Já nem vejo noticiários, senão começo a ficar logo deprimida. As próprias televisões e jornalistas "bebem" essa dor e a "esguincham" para o espectador.
Também é necessário informar, para que se saiba dos crimes que acontecem.
Mas o que deviam mesmo ser trabalhado era a prevenção. Educar as pessoas, antes que as situações aconteçam. Isso sim acho que era mais importante e melhor.
Um bom resto de semana :)

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