No último fim de semana fui a São Gonçalo visitar a minha irmã Rosa. Fui pelos modais de costume: trem, ônibus, barca, ônibus. Gosto de passar na praça XV, pelos ecos do passado barroco ali presentes, e mais recentemente para “fiscalizar” as obras em andamento naquela região, que prometem revitalizar lindamente toda a orla, do Largo da Misericórdia até o cais do porto. Tenho outra motivação antiga: cruzar a Baía de Guanabara, por cujas águas naveguei, entrando nesta cidade, há mais de 58 anos. É um regalo aos olhos e um resvalar em nostalgias que me serenam a alma, longe das aflições de agora.
Pois bem. Em Niterói fiz um lanche e dirigi-me ao terminal rodoviário para a última etapa da viagem. Antes deparei-me com um grupo de teatro de rua, se assim posso dizer; um ator e uma atriz (jovens) representavam no chão, sem que eu pudesse atinar do que se tratava; várias mulheres à volta ostentando cartazes, em silêncio. Pus-me a ler os cartazes: todas elas eram vítimas de abuso sexual na infância ou adolescência. Os atores representavam um roteiro de pedofilia doméstica (pai e filha), possivelmente óbvio, mas convincente e angustiante para mim, que o assistia. Retirei-me. A serenidade interior esvaíra-se.
Não que no meu tempo não houvesse pedofilia. Nem tenho reparos a fazer ao grupo que se manifestava em repúdio a esse abominável crime contra a infância. É preciso mesmo divulgar e conscientizar as pessoas sobre esses fatos, infelizmente, ainda corriqueiros. Retirei-me porque estou saturado desses horrores: crianças maltratadas, abusadas; crianças morrendo de fome e doenças; outras fugitivas da guerra, com suas famílias, embarcadas como escória em frágeis embarcações, na esperança de uma vida melhor, e muitas delas finalmente sepultadas no fundo do Mediterrâneo.
Retirei-me porque estou cansado de tanta informação ruim. Se fico em casa a televisão me bombardeia, se saio... O mundo está virando um circo dos horrores (ou já era e não sabíamos).
E ver aquela menina com os olhinhos fixos na teleobjetiva, em meio à grande tragédia, e ainda assim, com tanta inocência, esboçar um leve sorriso… dói...
4 comentários:
Olá, João,
Eu também tenho sentido esta mesma estupefação, frente a muitos acontecimentos do nosso tempo, sei lá, parece que a vida radicalizou, rsrs. Acho, inclusive danoso, o modo como muita gente expressa rejeição a um acontecimento ou idéia, atualmente. Mas acredito que as coisas voltarão ao equilíbrio, pois os comportamentos são cíclicos. Ah, só cheguei aqui porque há uns três dias começaram a aparecer o feed de alguns blogs (o seu, entre eles), cuja atualização nunca me era apresentada no blogger.
Um abraço
Oi, João!
Atualmente para chamar atenção, tem que chocar! Pois a banalização está presente no comportamento como se as pessoas vivessem anestesiadas. Essa angustia que sentiu e o desarranjo interior, só provam que o grupo teatral conseguiu o seu intento e o fez pensar sobre o assunto que é revoltante.
No passado do "Luz" organizei uma blogagem coletiva "Contra a pedofilia, em defesa da infância", na qual encaminhei para o senado uma carta com os links dos participantes como se fosse um abaixo assinado, pedindo a abertura de uma CPI. O único que se prestou a ajudar foi o senador Magno Malta que vestiu a camisa, abriu a CPI e até hoje luta para que seja aprovada prisão perpétua para pedófilos. Para mim, bastava que fossem castrados... rs.
Beijus,
Vô tonico, tenho a mesma opinião da Luma. Às vezes é necessário um choque de realidade para que as pessoas parem , pensem e ajam face a tanta injustiça.
abraço, garoto
Percebo bem o que diz. Já ando mais que farta, saturada de tanta violência, coisas más e horrores com que somos bombardeados no dia a dia. A vida sempre foi difícil e complicada, com guerras, fome, doenças. Mas o que eu acho que mudou foi a exploração das situações, da dor dos outros. Já nem vejo noticiários, senão começo a ficar logo deprimida. As próprias televisões e jornalistas "bebem" essa dor e a "esguincham" para o espectador.
Também é necessário informar, para que se saiba dos crimes que acontecem.
Mas o que deviam mesmo ser trabalhado era a prevenção. Educar as pessoas, antes que as situações aconteçam. Isso sim acho que era mais importante e melhor.
Um bom resto de semana :)
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