16 de mai. de 2018

Pessimismo

Hoje amanheci como amanheço todos os dias: contente por mais um dia. Vou à cozinha beber um gole de café e a televisão anuncia mais uma tragédia do cotidiano carioca: uma mocinha, na Ilha do Governador, teve a sua vida estupidamente ceifada. Por um celular! O celular estava bloqueado e a mocinha, nervosa, não conseguiu desbloqueá-lo. Por isso recebeu um tiro na cabeça! Não resistiu...
 E logo agora que estava disposto a comprar um celular só para comunicar-me com a minha Rita quando demoro um pouco mais na rua, ou para chamar um táxi. Sei não, fiquei "bolado".
E eram apenas dois meninos!
Nessas horas me bate uma nostalgia dos tempos em que o bandido surrupiava o incauto com habilidade e destreza, sem que a vítima sequer percebesse. Ou do velho "conto do vigário". Eram tempos românticos!
Sem a opção de desligar a televisão (a Rita estava assistindo), levo para fora o lixo, varro o quintal e a calçada, como faço todos os dias. E volto para tomar café. Da geladeira, pego salada de frutas; do armário, um prato. E por instantes fico confuso, sem saber para que o queria. Queria mesmo era uma tigela. E novamente fico confuso ao abrir uma gaveta. Por que aquela gaveta, se quero uma colher?...
Rita saiu para uma visita. Penso: que farei hoje? A minha obrigação diária está feita, ver televisão nem pensar, estou farto. Desenhar a planta-baixa de uma obrinha que pretendo fazer no quintal? Rascunhar ilustrações do meu próximo livrinho? Escrever no Vô Tônico, de há muito quase abandonado, preguiçoso que ando com a palavra escrita, apesar de ter já três livrinhos aguardando a pública luz?
E aqui estou, frente ao computador, temperando uma salada de palavras e estruturas sintáticas.
Naqueles momentos confusos que mencionei, passou-me pela cabeça um fato, uma história não vivida, mas que pode ser pertinente ao que escrevo e ao estado d'alma em que me encontro.
Li, algum tempo atrás, sobre uma pesquisa que determinava um ranking dos povos mais felizes do mundo. O povo mais feliz, - pasmem! -, era uma pequena comunidade no interior da África. Desculpem não poder mencionar a entidade pesquisadora, os critérios de pesquisa, bem como esse povo feliz e o país africano onde vivem. A memória guarda apenas o essencial. E o essencial era a felicidade desse povo.
Por que eram felizes? Porque tinham tudo que precisavam!
Não era muito. Moravam em palhoças, mas cada família tinha a sua. Praticavam agricultura de subsistência, manufaturavam do barro utensílios domésticos, fiavam e teciam. Não tinham saneamento básico, escola ou posto de saúde. Conheciam e usavam a rústica carroça de tração animal e tosco ferramental agrícola. De tecnologia mais avançada, só a bomba manual para puxar água dos poços.
Não era muito, mas era tudo o que conheciam. E tinham tudo o que conheciam. E mais não precisavam porque mais não conheciam.  E por isso eram felizes. Os mais felizes do mundo, segundo a pesquisa.
Meus queridos, com todo o respeito e admiração por esse povo, isto é o que se pode chamar de santa ignorância!   

3 comentários:

Poesia do Bem disse...

Muito bom!

Jussara Neves Rezende disse...

De fato eram tempos românticos... difícil - sem ignorar muito - enfrentar o que nos cerca. Muito bom encontrar um texto seu... ainda que com esse toquezinho pessimista...

Denise Kirsch Oliveda disse...

Oi Joao, obrigada pelas suas visitas lá no blog, sempre me deixam muito feliz. E também gostaria de avisar-te que ontem recebi o livro. Amei, já li e estou esperando a oportuniddae de presentear a meu neto. Li seu texto acima e concordo, pois nao entendo esses povos. Te digo porque esse ano estive duas vezes na àfrica. Em janeiro fui ao Egito e abril estive no Marrocos. Nesses dois países tive a oportunidade de conhecer várias cidades e pequenos povoados. Todos, sem exceçao, ao menos no Egito eram paupérrimos. Vivendo em lugares horriveis, como voce descreve em seu texto, mas felizes. Sim, incrivelmente felizes. E isso nos deixava descocertados, porque eu nao poderia viver tamanha miséria e sorrir. E se ve que é uma alegria genuina. Sao assim. Dá até uma certa inveja, porque as vezes me pego reclamando de coisa pequena... mas felizes mesmo ago que sao os islandeses!!! beijo querido e visite o blog, seu livro foi motivo de muitas reflexoes.

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