27 de mai. de 2011

O BICHO COSTUREIRO (Parte 1)

O menino curioso



No tempo em que as mães contavam histórias a seus filhos ao redor da lareira, havia um menino muito curioso que vivia espiando a vida dos bichos e observando tudo o que de interessante tem a natureza. Todos o tratavam por Tonico da Tiana, e Tiana era sua mãe.

Um dia Tiana foi à costureira encomendar uma peça de roupa. Tonico foi junto e ficou encantado com a máquina de costura, com aqueles mecanismos que tão bem sabiam costurar! E quis logo abrir a janelinha redonda da máquina para ver por dentro como funcionava aquela maravilha. Tia Rosinha, a costureira, advertiu-o:

- Não mexas aí, Tonico, podes machucar-te!

E como o menino continuasse mexendo, a costureira insistiu:

- Já te disse, não mexas! Tem aí dentro um bicho que gosta de morder menino curioso. E ele já está indo para a janelinha, não tarda a morder-te o dedinho mexelhão!

O menino olhou para sua mãe como a indagar se era verdade o que tia Rosinha dizia. Sua mãe confirmou, balançando a cabeça e dizendo:

- Pois é, tem sim. Não mexas...

E por muitas outras vezes que lá foi e tentou abrir a janelinha, o menino ouviu a mesma lengalenga: "Não mexas, olha o bicho!". E por sua mãe confirmar, não tinha mais dúvidas: havia mesmo um bicho ali dentro, talvez um bicho costureiro – a alma da máquina de costura. Como seria interessante ver o tal bicho, conhecer sua aparência, saber que poderes tinha! Mesmo com o risco de levar uma mordida no dedo.

A curiosidade de Tonico não o deixou desistir e, sempre que se desgarrava de sua mãe, ia espiar a máquina de costura, na esperança de ver o bicho costureiro. Um dia, estando a vigiar, viu a costureira arreliar-se com a máquina: parara de funcionar, enguiçara sem mais nem por que, de repente! Os mecanismos giravam, faziam tudo que costumavam fazer, mas as linhas não se entendiam e a costura não se realizava! A mulher já fizera de tudo na vã tentativa de trazê-la de volta ao trabalho; não sabia mais o que pudesse fazer e lamentava-se ao marido:

- E essa agora... Como pode, se até ontem funcionava tão bem? Que diabos lhe aconteceu, para escangalhar desse jeito?

Tio Jaime limitava-se a rodear e olhar a máquina sem dizer palavra, pois de máquinas nada entendia, nem de costura nem de outras.

- E logo agora que tenho tantas encomendas por fazer! Ai de mim!... Não há outro jeito senão chamar o Elias mecânico, e sem mais tardança... Diacho!

Tonico saiu dali pensando que talvez a máquina de costura houvesse perdido a sua alma; o bicho costureiro, ao que tudo indicava, evadira-se...


Vendo e ouvindo na mata


Nada mais interessante que um passeio na mata. Há muitas coisinhas bonitas de se ver, plantas, flores e bichos, muitos bichinhos. Há cores e perfumes. E variados sons, desde os mais delicados, como o da brisa correndo entre as folhas do arvoredo ou o sussurrar das águas no córrego; até os mais estridentes, como o cantar-de-uma-nota-só da cigarra ou o cri cri cri dos grilos do campo. Ah, que graça estes bichinhos! Acordam aos primeiros raios de sol e saem dos buraquinhos onde moram para comer e cantar. E como cantam (ou falam?)! Como são cricrizeiros, esses grilos do campo!

Tonico passeava na mata pleno de encanto, e cheirava os cheiros, e ouvia os sons, e tudo observava: formigas cortadeiras derrubando folhas de um arbusto, enquanto outras as levavam, em carreira, ao formigueiro; lagartas descendo um tronco, em fila, uma exatamente atrás da outra, arrumadinhas e disciplinadas – uma procissão lagartal.

Agora era um barulhinho de come-come: uma lagarta verde empanturrava-se em cima de uma folha.

Mais além, estranhas folhas duplas formando algo como casulos. Tonico examinou-as: pareciam estar costuradas, duas a duas, por finíssimo fio de seda. O menino espiou pela abertura na extremidade das folhas: os casulos estavam vazios. Quem teria feito aquilo? Tonico imediatamente pensou no bicho costureiro fugido da máquina de costura. Estaria escondido na mata? Pensando nisso, prosseguiu o passeio, agora mais interessado nos casulos de folhas costuradas.

Bem perto dali, entre os galhos de um arbusto, uma aranha tecelã construía sua teia. Uma voz miudinha, quase inaudível, chamava:

- Comadre, ó comadre!

Tonico espantou-se! Seria possível? Aproximou-se um pouco mais e apurou os ouvidos. Sim, outra aranha falava à tecelã:

- Já soube da novidade, comadre?

- ???

- Temos vizinho novo; um tal de bicho costureiro que anda a costurar pela mata. Não se fala noutra coisa...

- Não me importo... desde que não me venha fazer concorrência.

- Não. Ele só costura, não tece.

- Pois então... não me importo. Só quero saber de moscas, mosquitos e outros petiscos semelhantes. Outros bichos não me interessam.

- Desculpe. Pensei...

- Pois pensou mal, comadre, pensou muito mal. Não perco tempo com a vida alheia nem gosto de gente curiosa, como esse menino que está com o nariz em cima da minha teia: se der um espirro, lá se vai todo o meu trabalho. Arreda menino, arreda!

Tonico afastou-se da teia, ouvindo ainda uma última fala da aranha tecelã:

- Vá, comadre, vá cuidar da sua vidinha, vá, vá!

A mata nunca estivera tão interessante quanto naquele dia. Pois se até os bichos falavam! E não havia dúvida: o bicho costureiro estava ali. O menino saiu à sua procura, seguindo a pista das folhas costuradas.

(continua no próximo post)


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