
Indagado por Gama de sua identidade, o monstro responde:
Eu sou aquele oculto e grande cabo
Olá, caríssimos leitores!
Este que vos escreve, Adriana Kairos e outros companheiros diletantes da literatura e da poesia fomos entrevistados por Catarina Maul em seu programa Bem Cultural na TV Vila Imperial, de Petrópolis. Essa TV pode ser acessada aqui por meio da internet no endereço HTTP://www.tvvilaimperial.com.br
O programa será reprisado hoje (09/09) ás 23h30min, amanhã às 12h00min e domingo às 10h00min. Também poderá ser visto em PROGRAMAS GRAVADOS (clicar em Bem Cultural de 08/09/2011), no mesmo endereço. O programa começa com outras entrevistas: a nossa é na segunda parte. Faça esse carinho ao meu ego, que ninguém é de ferro!
Para quem ainda não sabe, saiu outra antologia da qual eu participo: Singular: O país dos invisíveis. Quem se interessar me comunique. Até mais, caríssimos.
Afinal, o bicho costureiro
Um piscar de olhos e Tonico já estava no bosque em que encontrara a moça da melancia: viagem mais impressionante que o mais impressionante dos sonhos! À sua frente, pairando no ar, a bola de fogo, que não era de fogo, mas resplandecia como o vestido de Morgana.
- Então, querias conhecer-me?
- O bicho costureiro, uma bola de luz?
- Sim, mas na verdade sou invisível. A luz que vês é por causa do vestido que fiz para a princesa Morgana, costurando milhares e milhares de vaga-lumes. Impregnei-me com a fosforescência deles. Cavacos do ofício...
- Mas disseram-me que foi uma velha...
- Pois foi...
E dizendo isto, a bola encolheu-se ao tamanho de um vaga-lume de luz intensíssima; depois cresceu, transformando-se numa árvore fosforescente; em seguida alongou-se como corda e evoluiu no ar em graciosos volteios, para finalmente descer em forma de balão.
- Entendes agora? Posso transformar-me no que quiser, não tenho forma definida. Virei-me numa velha e apresentei-me como costureira às princesas...
- E os vestidos, por que se desmancharam?
- Ah, que terríveis são aquelas meninas, que gênio! Os vestidos, costurei-os com uma linha mágica muito delicada, porém eficiente e apropriada a costuras igualmente delicadas, mas que não resiste a estados emocionais intensos: sentimentos negativos como ciúme, inveja, raiva, destroem a linha, desfazendo as costuras. Foi isso... Eu quis fazer os dois vestidos com pétalas, apenas variando a cor, mas a princesa Morgana insistiu em querer algo mais deslumbrante...
- E a masmorra?
- Ora, é impossível prender um espírito. Deixei-me trancafiar para não chamar a atenção, mas posso fugir até pelo buraco de uma fechadura.
- E como soube que eu queria conhecê-lo?
- Uma pombinha me contou...
- O Senhor...
- Você, se me faz o favor.
- Você também não gosta de meninos curiosos?
- Não há por quê! A curiosidade é mãe da ciência. Viva a curiosidade!
- E agora, ainda pretende correr mundo?
- Não, prefiro o sossego da minha máquina de costura. O mundo dos homens é muito complicado! Mas antes de voltar preciso livrar-me deste brilho, não vá tia Rosinha assustar-se, pensando que sua máquina pega fogo por dentro.
E dizendo isto, o bicho costureiro começou a sacudir-se no ar, fazendo movimentos rápidos de vai-e-vem para livrar-se da fosforescência. Propôs-lhe então o menino:
- Por que não se esfrega em minhas roupas, passando-me o brilho?
E assim fez o bicho, até ficar novamente invisível.
- Até mais ver. Cuida-te.
Tonico olhou a noite: breu puro, mas suas roupas iluminavam a mata ao redor. E das bandas do Reino das Princesas Vaidosas chegava ao bosque uma nuvem de alegres vaga-lumes
Epílogo
- Tonico! Tonico! Responde, meu filho!
Tiana procurava o filho na mata, aflita, pois de há muito o sol se apagara. Não era a primeira vez que o filho lhe aprontava uma dessas: vivia espionando as formigas, os grilos, as lagartas, os vaga-lumes e tudo o mais, e às vezes adormecia na mata. Como achá-lo naquela escuridão, pensou Tiana, que nem uma lanterna levava, tão apressada saíra de casa.
Um clarão entre as moitas conduziu Tiana ao filho adormecido na relva.
Ora, essa! As roupas a brilhar! Com certeza estava brincando com os vaga-lumes, pois nunca se viu tantos na mata, deduziu a mãe ao recolher o filho nos braços.
No dia seguinte Tonico dormiu até mais tarde e ao levantar-se, antes mesmo de tomar café, correu ao ateliê de costura da tia Rosinha. Estava lá o Elias mecânico.
- Ó tia Rosinha, a sua máquina está boa, não lhe encontrei nada de errado.
- Mas, como, se ontem não funcionava?
- Mas está ótima, experimente.
A costureira sentou-se com os pés na pedaleira, ajeitou um retalho sob a agulha e tic tic, tic tic, tic tic, a costura fez-se perfeita como nunca!
- Não entendo... não entendo... – balbuciou tia Rosinha. E quanto lhe devo seu Elias?
- Ora, não é nada. O que fiz foi só aplicar um tiquinho de óleo para lubrificar os mecanismos.
O tio Jaime observava tudo com expressão preocupada. Disse ao mecânico:
- Aceite ao menos merendar...
- Ah, pois claro, com muito gosto.
A costureira foi preparar a merenda enquanto seu marido chegava-se ao Elias e confidenciava:
- Não sei não, Elias, mas acho que a Rosa está caducando...
Tonico, que tudo observava, olhou a máquina de costura e sorriu. Depois saiu, sem pressa, chutando as pedrinhas do chão. Um bando de pombas passou voando e o menino acenou-lhes com as duas mãos: quem sabe não estaria entre elas a pombinha falante... ou a moça da melancia.
FIM
Perguntas que o leitor está fazendo agora
E a pombinha, encontrou o seu amor?
Encontrou. E o seu amo já era rei e a Moura Torta sua rainha!
A pombinha apareceu nos jardins do palácio dizendo: "Onde andará meu amo e a sua Moura Torta?". O jardineiro ficou intrigado com a fala e contou ao rei, que mais intrigado ficou. O rei mandou então que o jardineiro prendesse a pombinha e a levasse até ele. Logo se afeiçoaram. Mas a rainha, percebendo de quem se tratava, caiu de desejos por uma sopa de pombinha e nada a fez desistir de seu intento, até que o rei cedeu. Antes de dar a ave para a cozinheira real, porém, o rei acariciou-lhe a cabecinha e descobriu o alfinete que lhe cravara a Moura Torta. Então retirou o alfinete e o encantamento se desfez, virando pombinha em moça da melancia. A Moura Torta foi duramente castigada e expulsa do palácio. E o rei viveu feliz para sempre com sua nova rainha.
Cabe ainda outra pergunta: como um moço pobrezinho, que no início da história só tinha uma melancia, no final vira rei de um reino?
Não sei. Minha mãe não me contou. Nem contaram pra ela. Ao que tudo indica, a história da Moura Torta – da tradição oral – chegou truncada até nós, faltando um pedaço. Ninguém sabe, ninguém saberá...
PS: Li recentemente em "Contos Tradicionais do Brasil", de Câmara Cascudo, uma versão recolhida no Nordeste brasileiro na qual o moço não é pobrezinho, mas filho de rei, príncipe portanto, e filho único. Ao sair pelo mundo, encontra uma velhinha carregando um feixe de lenha e oferece-lhe ajuda; em agradecimento a velha lhe dá três laranjas (encantadas, claro). No mais a história segue como acima. A variante que contei foi-me passada por minha mãe e coincide com a de Monteiro Lobato em "Histórias de Tia Nastácia".
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O vestido de folhas
Foi ter a um bosque denso e sombreado. Havia ali uma fonte a minar do chão e formando uma poça de água fresca e cristalina. Pôs-se de cócoras, para beber dela pelas mãos em concha. Antes de estar saciado completamente, viu no espelho d'água um rosto refletido. E não era o seu, pois nem tinha cabelos loiros nem feições femininas! Ergueu-se, olhando para cima: uma belíssima jovem escondia-se entre as folhas de um galho!
- Ora, se não é a moça da melancia! – exclamou Tonico, lembrando-se da história que tantas vezes ouvira de sua mãe.
Era assim a história:
Um pai pobrezinho deu a cada um de seus três filhos uma melancia quando estes resolveram correr mundo, recomendando-lhes que só as abrissem onde houvesse água. O filho mais velho esqueceu a recomendação do pai e abriu a melancia longe da água; de dentro da melancia saiu uma linda jovem que lhe pediu leite ou água e como não houvesse nem uma coisa nem outra, a jovem morreu. Com o filho do meio aconteceu o mesmo.
O filho caçula, porém, lembrando-se das palavras do pai, abriu a melancia junto a uma fonte; a jovem bebeu água à farta e salvou-se. Mas como estivesse nua, o rapaz escondeu-a nas folhagens de um galho acima da fonte, dizendo-lhe que dali não saísse até que voltasse com roupas.
Mais uma vez a história ia repetir-se, agora sob o olhar do menino.
A jovem fez menção de sair de entre as folhas e Tonico, cavalheirescamente, virou-se de costas, para que não ficasse constrangida em sua nudez. A moça riu-se e disse:
- Não precisa dar-me as costas, estou vestida, olha...
De fato, a jovem trajava um vestido de folhas, todas costuradinhas por finíssimo fio.
- Mas, como foi isto?!
- Passou por cá um costureiro e fez-me este vestido. Não é grande coisa, mas evita-me a vergonha, já que o meu senhor demora-se tanto.
O menino já sabia de qual costureiro a jovem falava, mas perguntou:
- E como é esse costureiro?
- Não sei – respondeu-lhe a jovem. É invisível, mas costura muito bem, e rápido.
- E para onde foi?
- Disse que ia correr mundo em busca de fama e fortuna.
- Ah... E quanto a ti, é melhor que te escondas muito bem. Pode vir alguém...
- Eu sei. Já esteve cá uma velha muito feia e torta, a buscar água. Viu o meu rosto refletido na fonte e pensou que era o dela. Então disse: "Sendo tão bonita assim, por que trabalho eu para os outros?". Em seguida quebrou o cântaro e foi embora. Foi tão engraçado! Contive-me a muito custo, para não estourar de rir!
- A velha vai retornar, não te descuides...
- Que pode uma velha daquelas contra mim? De mais a mais, o meu amo não tarda a chegar.
Tonico teve vontade de contar-lhe tudo o que estava por acontecer, mas achou melhor deixar a história cumprir-se. Despediu-se e afastou-se. Ainda queria encontrar o bicho costureiro.
A Moura Torta
A velha muito feia e torta, a Moura Torta, como era conhecida, retornava à fonte com outro cântaro, depois de ter sido espinafrada por sua patroa. Vinha cantando, ou melhor, resmungando uns versos, tortamente – sem ritmo e sem melodia – com sua voz rouca e expressão enfezada, como a lamentar-se por toda uma vida de trabalhos sem proveito:
Ai, minha mãe dos trabalhos
Para quê trabalho eu?
Trabalho, mato o meu corpo
Não tenho nada que é meu (1)
A velha metia medo a qualquer criança, mas Tonico criou coragem e saltou-lhe na frente.
- Raios! Só me faltava esta: um fedelho no meu caminho! Arreda, fedelho, não vês que estou a trabalho?
- Desculpe, Senhora D. Moura, mas queria saber se tem notícias do bicho costureiro
A moura gostou da maneira educada do menino e desfez a carranca.
- Não sei de que bicho estás falando...
- Do bicho costureiro que fugiu da máquina de costura da tia Rosinha. Soube que foi correr mundo e desejava muito avistar-me com ele.
- Já sei... Tu és um desses meninos curiosos que querem saber tudo, conhecer, mexer... Não gosto de gente assim, vivem aprontando. Sei de um que desmontou um relógio "só pra ver como era" e nunca mais conseguiu montá-lo. Ah, curiosos!!!... Quanto ao bicho de que falas, se é costureiro e costura bem...
- Costura muito bem, eu garanto.
- Nesse caso pode estar no Reino das Princesas Vaidosas. Elas são muito exigentes e não se satisfazem com qualquer costureirazinha...
- E onde fica esse reino, Senhora?
- É perto daqui. Segue sempre em frente e chegas lá: depois dos campos de trigo.
- Agradecido, Senhora.
- Não tem de quê. Agora me deixa ir, tenho muito a fazer. Ai, minha mãe dos trabalhos!
O menino afastou-se em direção ao Reino das Princesas Vaidosas. E foi pensando na história que se desenrolava no bosque.
Retornada à fonte, a moura viu-se novamente refletida na água e novamente julgou-se belíssima e novamente quebrou o cântaro. Então a jovem não resistiu e deu uma gargalhada. Descoberta, contou à velha a sua história. E a moura, antevendo vantagens, ofereceu-se para pentear-lhe os lindos cabelos doirados. Por ingênua ou vaidosa, ou por ambas as coisas, a jovem deixou-se pentear e a velha, enquanto o fazia, espetou-lhe um alfinete na cabeça, virando-a em pombinha! A Moura Torta era uma bruxa...
Já Tonico marchava rumo ao Reino das Princesas Vaidosas quando uma pombinha branca, voando do bosque, alçou no azul do céu sobre o ouro dos trigais.
(continua no próximo post)
No tempo em que as mães contavam histórias a seus filhos ao redor da lareira, havia um menino muito curioso que vivia espiando a vida dos bichos e observando tudo o que de interessante tem a natureza. Todos o tratavam por Tonico da Tiana, e Tiana era sua mãe.
Um dia Tiana foi à costureira encomendar uma peça de roupa. Tonico foi junto e ficou encantado com a máquina de costura, com aqueles mecanismos que tão bem sabiam costurar! E quis logo abrir a janelinha redonda da máquina para ver por dentro como funcionava aquela maravilha. Tia Rosinha, a costureira, advertiu-o:
- Não mexas aí, Tonico, podes machucar-te!
E como o menino continuasse mexendo, a costureira insistiu:
- Já te disse, não mexas! Tem aí dentro um bicho que gosta de morder menino curioso. E ele já está indo para a janelinha, não tarda a morder-te o dedinho mexelhão!
O menino olhou para sua mãe como a indagar se era verdade o que tia Rosinha dizia. Sua mãe confirmou, balançando a cabeça e dizendo:
- Pois é, tem sim. Não mexas...
E por muitas outras vezes que lá foi e tentou abrir a janelinha, o menino ouviu a mesma lengalenga: "Não mexas, olha o bicho!". E por sua mãe confirmar, não tinha mais dúvidas: havia mesmo um bicho ali dentro, talvez um bicho costureiro – a alma da máquina de costura. Como seria interessante ver o tal bicho, conhecer sua aparência, saber que poderes tinha! Mesmo com o risco de levar uma mordida no dedo.
A curiosidade de Tonico não o deixou desistir e, sempre que se desgarrava de sua mãe, ia espiar a máquina de costura, na esperança de ver o bicho costureiro. Um dia, estando a vigiar, viu a costureira arreliar-se com a máquina: parara de funcionar, enguiçara sem mais nem por que, de repente! Os mecanismos giravam, faziam tudo que costumavam fazer, mas as linhas não se entendiam e a costura não se realizava! A mulher já fizera de tudo na vã tentativa de trazê-la de volta ao trabalho; não sabia mais o que pudesse fazer e lamentava-se ao marido:
- E essa agora... Como pode, se até ontem funcionava tão bem? Que diabos lhe aconteceu, para escangalhar desse jeito?
Tio Jaime limitava-se a rodear e olhar a máquina sem dizer palavra, pois de máquinas nada entendia, nem de costura nem de outras.
- E logo agora que tenho tantas encomendas por fazer! Ai de mim!... Não há outro jeito senão chamar o Elias mecânico, e sem mais tardança... Diacho!
Tonico saiu dali pensando que talvez a máquina de costura houvesse perdido a sua alma; o bicho costureiro, ao que tudo indicava, evadira-se...
Vendo e ouvindo na mata
Nada mais interessante que um passeio na mata. Há muitas coisinhas bonitas de se ver, plantas, flores e bichos, muitos bichinhos. Há cores e perfumes. E variados sons, desde os mais delicados, como o da brisa correndo entre as folhas do arvoredo ou o sussurrar das águas no córrego; até os mais estridentes, como o cantar-de-uma-nota-só da cigarra ou o cri cri cri dos grilos do campo. Ah, que graça estes bichinhos! Acordam aos primeiros raios de sol e saem dos buraquinhos onde moram para comer e cantar. E como cantam (ou falam?)! Como são cricrizeiros, esses grilos do campo!
Tonico passeava na mata pleno de encanto, e cheirava os cheiros, e ouvia os sons, e tudo observava: formigas cortadeiras derrubando folhas de um arbusto, enquanto outras as levavam, em carreira, ao formigueiro; lagartas descendo um tronco, em fila, uma exatamente atrás da outra, arrumadinhas e disciplinadas – uma procissão lagartal.
Agora era um barulhinho de come-come: uma lagarta verde empanturrava-se em cima de uma folha.
Mais além, estranhas folhas duplas formando algo como casulos. Tonico examinou-as: pareciam estar costuradas, duas a duas, por finíssimo fio de seda. O menino espiou pela abertura na extremidade das folhas: os casulos estavam vazios. Quem teria feito aquilo? Tonico imediatamente pensou no bicho costureiro fugido da máquina de costura. Estaria escondido na mata? Pensando nisso, prosseguiu o passeio, agora mais interessado nos casulos de folhas costuradas.
Bem perto dali, entre os galhos de um arbusto, uma aranha tecelã construía sua teia. Uma voz miudinha, quase inaudível, chamava:
- Comadre, ó comadre!
Tonico espantou-se! Seria possível? Aproximou-se um pouco mais e apurou os ouvidos. Sim, outra aranha falava à tecelã:
- Já soube da novidade, comadre?
- ???
- Temos vizinho novo; um tal de bicho costureiro que anda a costurar pela mata. Não se fala noutra coisa...
- Não me importo... desde que não me venha fazer concorrência.
- Não. Ele só costura, não tece.
- Pois então... não me importo. Só quero saber de moscas, mosquitos e outros petiscos semelhantes. Outros bichos não me interessam.
- Desculpe. Pensei...
- Pois pensou mal, comadre, pensou muito mal. Não perco tempo com a vida alheia nem gosto de gente curiosa, como esse menino que está com o nariz em cima da minha teia: se der um espirro, lá se vai todo o meu trabalho. Arreda menino, arreda!
Tonico afastou-se da teia, ouvindo ainda uma última fala da aranha tecelã:
- Vá, comadre, vá cuidar da sua vidinha, vá, vá!
A mata nunca estivera tão interessante quanto naquele dia. Pois se até os bichos falavam! E não havia dúvida: o bicho costureiro estava ali. O menino saiu à sua procura, seguindo a pista das folhas costuradas.
(continua no próximo post)
(leia primeiro as partes 1e2, abaixo)
Quando acordou, uma luz intensa varava suas pálpebras e atingia suas retinas cansadas. Abriu os olhos devagarinho, protegendo-os com a palma da mão. Brotando do chão à sua frente, quase aos seus pés, o tão procurado arco-íris, do vermelho ao violeta matizado, resplandecente e lindo! Eufórico, o velho levantou-se de um salto. Mas não havia panela de ouro ou qualquer coisa que semelhasse um tesouro. Decepcionado e triste, o velho lamentou-se por toda uma vida perdida.
- Que fiz eu da minha vida? Loucura, só loucura! E aquele contador de histórias, que grande trapaceiro! Não há panela de ouro, nem uma pepita sequer... Era tudo mentira!... Mais valera cultivar flores e aprender a dançar com aquela mocinha... e ter filhos com ela...
Raivoso e fora de si, o velho lançou-se aos socos e pontapés na base do arco-íris. Então percebeu que podia agarrá-lo, subir nele, montá-lo. E assim fez e foi caminhando nele com se fora uma estrada – a mais linda estrada de sua vida! E, quem sabe, o tesouro não estaria na outra ponta do arco-íris...
Passou as nuvens e alcançou as estrelas. Uma música antiga, que parecia conhecer, soou nos seus ouvidos e uma figura, ainda distante, rodopiou no espaço: era a mocinha da festa de casamento, dançando nas estrelas! Ah! que vontade de dançar com ela! Mas a bailarina das estrelas aproximou-se, dançou ao seu redor, sorriu e desapareceu no infinito.
O velho caminhou um pouco mais e viu outra figura entre as estrelas: era o floricultor cuidando de suas flores. E como eram lindas, as flores! Ou seriam estrelas?
Ainda admirado com o que via, o velho prosseguiu na sua caminhada sobre a estrada de luz. Uma estrela cadente riscou o céu. E mais outra. E outra mais. Uma chuva de estrelas cadentes! E todas vinham do mesmo lugar no espaço, como se algo ou alguém as impelisse. O velho continuou a caminhar, tentando entender o que acontecia, até finalmente reconhecer: era a menina de tranças arremessando estrelas no espaço, como se fossem pedrinhas sobre as águas de um regato!
- Brinca comigo... – disse a menina ao velho.
O velho sorriu, pegou-a pela mão e saiu, saltitando com ela nas estrelas. E era menino outra vez...
FIM
Há muito e muito tempo, num lugar que ninguém sabe, um menino ouviu de um velho contador de histórias que havia uma panela cheia de ouro, lá bem onde o arco-íris toca a terra. Um dia, durante a estação das chuvas, saiu de casa e caiu no mundo, disposto a encontrar esse tesouro.
Já andara muito quando encontrou uma menina de tranças pulando de pedra em pedra sobre as águas de um regato. Disse-lhe a menina:
- Brinca comigo...
- De quê? – perguntou o menino.
- De pular, ou de jogar pedrinhas na água e ver os círculos que elas formam.
O menino considerou não valer a pena atrasar-se por brincadeira tão boba. E seguiu.
Muito além daquele sítio encontrou um camponês plantando flores. Disse-lhe o floricultor:
- Vem ajudar-me. As flores te darão o sustento e alegrarão a tua vida.
- Flores dão muito trabalho e demoram a crescer. E eu tenho pressa: busco uma riqueza maior...
Caminhando de sol a sol e descansando à noite, foi ter a uma fazenda onde se realizava uma festa de casamento. Apresentou-se e felicitou os recém-casados e seus pais, que o deixaram à vontade, apesar de ser forasteiro. Havia comida e bebida à farta e músicos animando os convidados. Comeu e bebeu – apressadamente! – e já ia embora quando uma mocinha lhe disse:
- Dança comigo...
Surpreso com o convite da mocinha, o menino passou a mão no rosto e só então percebeu que já não era menino, mas um rapazola, com os primeiros fios de barba a crescer.
- Desculpe, mas tenho um sonho a realizar. Talvez na volta... – respondeu o rapazola à mocinha, antes de se pôr a caminho.
(continua no próximo post)
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